quarta-feira, 4 de julho de 2012

DISCIPLINA ECLESIASTICA

Por Davi Helon de Andrade
            Lembro-me de que quando eu era menor, meus pais costumavam me disciplinar quando eu os desobedecia. E tenho a convicção que eles faziam isto porque queriam o melhor para mim e me amavam.
            Muitas vezes me disciplinavam para ensinar sobre a vida, como trabalho (limpar a casa), não mais mentir, não mais desobedecê-los, não mais falar palavrão, estudar, e tantos outros motivos.

            Dentro da Igreja também deve haver disciplina. É a disciplina que faz com que os crentes sintam-se responsáveis diante do Corpo de Cristo. A disciplina tem como objetivo a recuperação de pessoas, colocando-as no caminho certo, e também visa levar os crentes a temer mais ao Senhor.
            Wayne Grudem escreve:
Seria muito saudável para a igreja começar a pensar em disciplina não como um fardo imposto pelo Senhor, mas como um autentico “meio de graça”, pelo qual grandes bênçãos podem vir a igreja – reconciliando os crentes entre si e com Deus, fazendo voltar à obediência o irmão que está em pecado, exortando todos a que temam[1]”.    

       

          Infelizmente muitos não gostam da palavra disciplina dentro da Igreja como se fosse algo que excluísse a graça de Deus, pois Deus é amor. Mas ela é necessária, pois a Bíblia diz que a igreja é uma família, nascemos do Espírito (Jo 3.5,6) e somos chamados de filhos de Deus (Jo 1.14; Rm 8.14-16; Ef 1.5; 2.19), e como membros dessa família temos o cuidado do Pai (Mt 6.25-34) e também a disciplina (Hb 12.6). Aquele que não é disciplinado por Deus, é bastardo (12.8).
             Se vocês não são disciplinados, e a disciplina é para todos os filhos, então vocês não são filhos legítimos, mas sim ilegítimos”. Hebreus 12:8

A Bíblia nos trás ensinamentos bem claros quanto à disciplina, e usaremos para o nosso estudo como texto base Mateus 18.15-17.
            A luz deste texto veremos alguns passos para a disciplina com a comunicação direta.


1          OS PASSOS DA DISCIPLINA ECLESIASTICA

A         1o Passo: Você e o irmão.
           
Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão”. v. 15.
             
A1       “Se o seu irmão”.

            A Bíblia diz que nós somos uma família (Ef 2.19), nascemos pelo Espírito (Jo 3.5,6), e pelo Espírito podemos chamar a Deus de pai (Rm 8.14-16), ou seja, dentro de uma Igreja, somos todos irmãos.
            Antes de tudo temos que nos tratar como irmãos e não como inimigos. Não é o objetivo deste estudo, mas temos que viver a “mutualidade cristã” (Sig Reciprocidade, troca) e podemos contar pelos menos 25 delas no Novo Testamento.


1.     Amem-se uns aos outros (Rm 12.10)
2.     Aceitem-se uns aos outros (Rm 15.7)
3.     Saúdem-se uns aos outros (2 Co 13.12)
4.     Cuidai uns dos outros (1 Co 12.25)
5.     Sujeitem-se uns aos outros (Ef 5.21 -22)
6.     Suportem-se uns aos outros (Cl 3.13)
7.     Não tenham inveja uns dos outros (Gl 5.26)
8.     Deixem de julgar uns aos outros (Rm 14.13)
9.     Não se queixem uns dos outros (Tg 5.9)
10.  Não falem mal uns dos outros (Tg 4.11)
11.  Não mordam e devorem uns aos outros (Gl 5.15)
12.  Não provoquem uns aos outros (Gl 5.26)
13.  Não mintam uns aos outros (Cl 3.9)
14.  Confessem os seus pecados uns aos outros (Tg 5.16)
15.  Perdoai-vos uns aos outros (Tg 5.15)
16.  Edifiquem-se uns aos outros (1 Ts 5.11)
17.  Ensinem uns aos outros (Cl 3.16)
18.  Encorajem uns aos outros (At 13.15)
19.  Aconselhem-se uns aos outros (1 Ts 5.12)
20.  Cantem uns para os outros (Cl 3.16)
21.  Sirvam uns aos outros (1 Pé 4.10)
22.  Levem as cargas uns dos outros (Gl 6.2)
23.  Hospedem uns aos outros (1 Pé 4.9)
24.  Sejam bondosos uns para com os outros (Ef 4.32)
25.  Orem uns pelos outros (Tg 5.16)


           Logo temos que entender que temos ordens bíblicas de zelarmos pelos nossos irmãos.

A2       “Pecar contra voce

A palavra pecado é (a`marth,sh|) e significa, “errar o alvo[2]”.
Errar o alvo de que maneira?
Pecado é qualquer coisa que se desvia (erra o alvo) dos absolutos de Deus.
            Logo qualquer pecado que venha a meu conhecimento é passível de eu ir ter com meu irmão. Por menor que seja, pois um alvo pode ser errado por milímetros.
           
            Qualquer pecado é contra Deus, e também é contra o corpo de Cristo, pois somos o corpo de Cristo e quando existe o pecado o corpo todo sofre. Por isso a necessidade de argüição. E por isso você tem uma ordem bíblica ir até o seu irmão e Argüi-lo, mostrar-lhe o erro (e;legxon – aoristo imperativo), “trazer a luz, expor, mostrar...convencer, apontar, persuadir[3]”.
            Quando sei do pecado do meu irmão e não vou argui-lo eu me torno cúmplice das obras infrutíferas das trevas.
            “Não participem das obras infrutíferas das trevas; antes, exponham-nas à luz.”. Ef 5.11

A3       entre ti e ele só”,
Não deve haver mais ninguém no processo, o texto é claro em afirmar que é somente entre ti e a pessoa.
            Gostamos muito de compartilhar com outras pessoas algo para orar, e isto até parece madura, mas dependendo do caso é errado.
            Muitas vezes fazemos porque gostamos de falar mal de outras pessoas. Mas é errado.
            Outro modo que muitas vezes fazemos, é falar do mal de um irmão na frente de outros irmãos, enquanto deveríamos ir ter com ele.
            Ou muitas vezes comentamos o erro de um irmão simplesmente por fofoca.
            Por mais simples que seja o erro do outro irmão eu não devo falar dele para outras pessoas, mas sim com ele mesmo. Pois se falo de outras pessoas eu não os ajudo crescer que é uma ordem bíblica (Cl 3.16), e entro no campo da fofoca que é outro pecado passível de argüição também:

            Lv 19:16 Não espalhem calúnias entre o seu povo. "Não se levantem contra a vida do seu próximo. Eu sou o Senhor.
            2 Tm 2:16  Evite as conversas inúteis e profanas, pois os que se dão a isso prosseguem cada vez mais para a impiedade...”
Tg 1.26  “Se alguém se considera religioso, mas não refreia a sua língua, engana-se a si mesmo. Sua religião não tem valor algum!”.
            Lembrem-se, por mais simples que seja o pecado do irmão a minha responsabilidade é ir até ele.
            É SUA RESPONSABILIDADE.
            Um conselho a ser dado, é que você ore antes de ir falar com o irmão, interceda, e depois vá. POIS MUITAS COISAS PODEM SER ESCLARECIDAS. (Exemplo do Jair)
            Diante desta primeira conversa dois fatos poderão ocorrer.

1o Fato: Se o teu irmão ouvir, você o recuperou e tudo termina;
2o Fato: Se ele não te ouvir, então dê o segundo passo, que vem a seguir.
           
B         2o Passo: Você e mais alguma pessoa.

            “Mas se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que ‘qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas”. v. 16

            O segundo passo só é dado se a pessoa não aceitar a repreensão do primeiro.
            Quando é a hora certa de passar do passo 1 ao passo 2? Devemos pedir a Deus discernimento e sabedoria para ver quando não há mais progresso no contato individual e está caracterizado que a parte ofensora não "quer ouvir".
            Veja que o segundo passo já envolve mais pessoas, as quais servirão de testemunha[4]. Neste caso chame um líder da igreja, um presbítero, ou alguém responsável por um ministério.
           
            Diante deste fato duas coisas poderão acontecer:

1o Fato: Se o irmão ouvir você e as pessoas que o acompanharam, vocês recuperaram esse irmão, e tudo termina aqui.
2o Fato: Se teu irmão não der ouvidos, então partam para o passo que vem a seguir.

C         3o Passo: Leve-o a Igreja.

            “Se ele se recusar a ouvi-los, conte à igreja; e se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão ou publicano.. v. 17

            Vamos frisar bem que o terceiro passo só poderá ser dado se o irmão não aceitar a repreensão do segundo. Como nos demais passos, um dos dois fatos a seguir surgirão como resultado.

C1       “O "dizer à igreja",

Em uma estrutura presbiteriana, equivale a relatar ao Conselho. Em qualquer situação, o relato, agora, deve ser feito pelo primeiro irmão ou irmã e pela outra ou outras testemunhas, envolvidas no Passo 2.
Se você já argüiu sozinho e agora com testemunhas e nada, escreva uma carta ao conselho da Igreja e entregue para que este tome providencias[5].
           
1o Fato: Se o irmão ouvir a igreja, encerra-se o caso e ele foi recuperado.
            2o Fato: Se o irmão não ouvir a igreja, ele dever ser considerado gentil e publicano, isto é, fora dos nossos.
                       
C2       4º Passo: Exclusão

            “...trate-o como pagão ou publicano.”
           
            Exclusão é a mais extrema medida disciplinar da Igreja. Exclusão por mais difícil que seja, é bíblico.
           

D         E as disciplinas públicas

            Dependendo do caso a disciplina deve ser pública, quando o pecado é público.
            Repreensão pública (I Tm 5.20) “Quanto aos que vivem no pecado, repreende-os na presença de todos, para que também os demais temam”.
            Nesta o individuo não é excluído da Igreja, mas repreendido publicamente.

“Pecados públicos quer dizer, não meramente pecados cometidos em publico, mas pecados que causam ofensa pública e muito geral[6]”.
            Podemos descartar alguns exemplos.
·         Escândalo sexual (adultério, sexo pré-conjugal)
·         Escândalo financeiro.
·         Vícios.
·         Brigas em público.
           
Paulo nos dá também um exemplo em I Coríntios 5.I-13 de exclusão pública do individuo que aparentemente não quer reconciliação.
A pecados que o ofensor terá que ir pedir perdão ao ofendido, pois senão ele não poderá cultuar a Deus. (Muitas vezes o ofendido é a igreja toda).
“Portanto, se você estiver apresentando sua oferta diante do altar e ali se lembrar de que seu irmão tem algo contra você, deixe sua oferta ali, diante do altar, e vá primeiro reconciliar-se com seu irmão; depois volte e apresente sua oferta.” Mateus 5:23-24


E         Como é aplicada a disciplina?

Em todo momento, a disciplina deve ser com o desejo de restaurar o irmão e nunca retalhá-lo.
A Igreja presbiteriana do Brasil tem no seu manual que:
“As censuras na igreja podem ser escalonadas desde a simples admoestação, pela exclusão da Ceia do Senhor, até a expulsão da congregação”.
Dependendo do caso somente uma simples admoestação e pronto, o irmão é admoestado e tudo se resolve.
Se alguém cometeu um pecado publico, mas se arrependeu, se o indivíduo tem cargos na Igreja, é sadio tirá-lo por um momento dos cargos, até a recuperação final e neste momento alguém acompanhá-lo até a recuperação.
Mas, se a pessoas não se arrepende e nem mostra mudança, deve ser excluída.


II          IMPLICACOES DE NÃO HAVER DISCIPLINA

A         Quando não vou até o irmão, me torno cúmplice das obras das trevas.
Quando sei do pecado do meu irmão e não vou argui-lo eu me torno cúmplice das obras infrutíferas das trevas.
            “E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as”. Ef 5.11 

B         A falta de disciplina trava a Igreja
            Josué 7.1-26
            Quando eu não vou até o irmão que eu sei que esta em pecado eu estou sendo conivente com o pecado dele e sei de algo que esta impedindo o crescimento da igreja, tanto numérico como espiritual.
            Um grande exemplo é que quando o povo de Israel estava conquistando a terra prometida e o Senhor havia dito para que houvesse santificação no meio do povo porque ele faria maravilhas (Js 3.5), o povo atravessou o Jordão, e tiveram vitória contra Jericó, porém o senhor havia dito:
            “Mas fiquem longe das coisas consagradas, não se apossem de nenhuma delas, para que não sejam destruídos. Do contrário trarão destruição e desgraça ao acampamento de Israel.
Josué 6:18
”. Js 6.18

            O povo venceu a batalha, e continuo seu caminho, e agora enfrentaria Ai e era um povo bem menor que Jericó (Js 7.5) e Israel foi envergonhada lutando contra este povo (Js 7.4,5).
            O motivo foi que um homem chamado Acã havia pegado despojos de guerra em Jerico e os escondeu (Js 7.20,21).
            Neste texto o pecado não foi imputado somente a Acã, mas a toda a nação (Js 7.11).
            No caso de Acã ele foi julgado segundo as regras da época, ele e sua família foram apedrejados (Js 7.25)
            Quando existe pecado no meio do povo de Deus e não trabalhamos com ele, a Igreja trava, pois somos um corpo e podemos perder pequenas batalhas. Pelo pecado de um, todo o corpo pode travar.


III         QUAL O PROPÓSITO DA DISCIPLINA?

A.   Glorificar a Deus por intermédio da obediência às Suas instruções (Mt 18.15-17).
B.   Recuperar o ofensor, “se...ouvir” (Mt 18.15-17) (2 Ts 3.15).
C.   Manter a pureza da igreja e sua adoração (1 Co 5.6-8).
D.   Exigir a integridade e a honra de Cristo e a doutrina que ele ensinou (2 Co 2.9, 17).
E.   Impedir outros de caírem também em pecado (1Tm 5.20).
F.    Evitar darmos causa a Deus para Ele próprio voltar-Se contra uma igreja local (Ap 2.1-7).

Nosso propósito na disciplina nunca deve ser punir alguém com um desejo de vingança, mas sempre restaurá-lo e curá-lo.
            A disciplina deve ser feita com bondade e humildade e com uma genuína avaliação de nossa própria fraqueza, acompanhada de um temor de que podemos cair em pecado semelhante.
            “Irmãos, se alguém for surpreendido em algum pecado, vocês, que são espirituais deverão restaurá-lo com mansidão. Cuide-se, porém, cada um para que também não seja tentado”. Gl 6.1


CONCLUSÃO
           
            Como tenho agido diante dos pecados?
            Que possamos sempre seguir os passos.
            Eu sei que não é fácil para nenhum de nós o fato de trabalharmos com disciplina, e difícil, especialmente quando envolve entes queridos.
            Vamos nos ajoelhar neste momento pedindo a Deus, que nos livre de sermos disciplinados, que Ele tenha misericórdia de nós, mas que Ele também nos de força e sabedoria em tratarmos deste assunto na Igreja.
            E que nossa Igreja seja uma Igreja limpa e que continue marchando sobre a terra sem empecilhos.


Até o próximo post


[1] GRUDEM, Wayne A. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p.
[2] BROWN, Colin, COENEN, Lothar. (orgs). Dicionário internacional de Teologia do Novo Testamento. 2.ed. São Paulo: Vida Nova, 2000, p. 1602.
[3] RIENECKER, Fritz, ROGERS, Cleon. Chave lingüística do Novo Testamento grego. São Paulo: Vida Nova, 1995. Pag. 70.

[4] (Dt 19.15, uma lei antiga com o propósito de reconciliação).
[5] Manual Presbiteriano edição especial com notas, jurisprudência e resolução do SC-IPB / Silas de Campos (Organizador). São Paulo: Cultura Cristã, 2008, pag. 96.  Capítulo VI,  Art 42. Parágrafo 2.
[6] BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2001, pag.553.

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